A Honra Perdida de Katharina Blum, Heinrich Boll (1974)
Ficção - Clássicos
O enredo, magnificamente sintetizado e de fácil leitura, coloca uma importante questão ao leitor - a liberdade de expressão é um fim que justifica todos os meios? Ou talvez não seja esta a questão, não tão radical, pelo menos. Não, a pergunta que paira e que transcende a obra assenta em saber, em que medida, a liberdade de expressão pode ter o direito a explorar, distorcer e arruinar uma pessoa.
Em menos de cem páginas o escritor laureado relata a história de Katharina Blum, uma mulher, governanta, sem mácula, que vê a sua vida desaparecer em pedaços à medida que a sua privacidade e intimidade é exposta num tabloide sensacionalista, depois de albergar, por uma noite, um homem procurado pela polícia e suspeito de assalto a um banco. Heinrich Boll, cria um distanciamento "higiénico" da história que conta, é objetivo e impassível. O relato do escritor, demonstra, por oposição, aquilo que poderia ter sido a cobertura mediática da notícia - no seu relato não há especulações, citações anónimas, fontes desconhecidas ou relatos distorcidos, existe uma descrição factual dos incidentes e um narrador imparcial.
Acompanhar a destruição de caráter, o aniquilamento da reputação e esmagamento da honra de alguém, deixa uma marca impactante no leitor, sobretudo porque facilmente nos conseguimos colocar nos pés de Katharina. Mas o problema no final é a dúvida, a dúvida que não desaparece, a honra e o caráter de uma pessoa permanentemente em cheque, uma nódoa indelével que nem o tempo pode conseguir recuperar.
Trata-se um livro extremamente atual - para não dizer, cada vez mais atual - em face das notícias falsas que invadem a nossa realidade, das ameaças populistas que pululam por todo o mundo, de uma ética fugaz, do imediatismo e consumismo que tudo querem justificar - aqui está um livro que deixa a reflexão ao leitor, uma reflexão sobre limites e abusos, sobre democracia e direitos humanos.
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